O solo de Manhattan suporta um peso imenso.
E penso qual seria o máximo de peso
no limite até o momento da cidade ser tragada.
A verticalidade do concreto me indaga:
O que sustentaria toneladas de edifícios e as casas de um centro.
E quantos decigramas para isso
colabora
a instantaneidade de um reles pensamento?
quinta-feira
sexta-feira
Parecia. O taxista estava bêbado. Vi sobre a luz laranja que dividia a via entre os que iam e os que vinham - era noite - o terço pendurado no retrovisor (e lembrei da estúpida que dizia que não importava que estivesse torto porque usava o espelho da maquiagem mesmo). Pensei em quantos já haviam partido desde que cristo era cristo. E desde Hitler. E ri. E ouvi com os fones no ouvido um som. E depois, um ruído.
quarta-feira
shhhhhhhhhhhh
shhhhhhhhhhhh
não fale nada na despedida:
é impossível gravar silêncio
para as palavras não há medida
nem para a vida, ressentimento
nada se guarda, nada se rasga
não pega fogo durante incêndio
não se esfacela n'água da enchente
não fica mágoa sobre a cadeira
não se faz nada com o não-dito
nem terapia nem desmentido
não se desvenda o vácuo: nem deus
nem mágico nem o infinito.
não fale nada na despedida:
é impossível gravar silêncio
para as palavras não há medida
nem para a vida, ressentimento
nada se guarda, nada se rasga
não pega fogo durante incêndio
não se esfacela n'água da enchente
não fica mágoa sobre a cadeira
não se faz nada com o não-dito
nem terapia nem desmentido
não se desvenda o vácuo: nem deus
nem mágico nem o infinito.
domingo
Vento, esse anônimo
Sentado de costas para a janela, na velha cadeira de balanço, jogou a cabeça para trás e viu o azul esplêndido. Dias como estes eram sua mais pura lembrança. O vento frio que vinha da praia, e a praia estava longe. Se pudesse ser uma força da natureza, certamente seria vento. Gelado, mas não congelante. Um vento realmente fresco que viria do sul distante e passara por um rio nascente. Teria percorrido as terras abertas do pampa? Corrido gados, destelhado galpões, entrado pela fresta da camisa do gaúcho e lhe arrepiado os pelos do abdômen? E o gaúcho pensaria na madrezita e dispararia no lombo do animal atrás do cheiro da mãe morta. Ou talvez o vento da praia em movimento chegava ali, agora, pela janela, depois de percorrer tantos quilômetros e carregar tanta areia e mudar geografias, mas já sem força para embalar a cadeira velha. O vento, esse anônimo, era uma lembrança que tinha. De quando não era inverno ou primavera. O entreato. Não se lembrava dele, desse jeito, em dias nublados ou úmidos. Era preciso um céu extensamente azul. E um dia despudoradamente iluminado para fazê-lo ventar em silêncio, mas rápido. A cabeça para trás via o céu e sentia o bom frio. Invisível ali, a memória de que enquanto o vento fosse legítimo, estaria vivo. A memória que corria na velocidade da ventania, mas na direção contrária, rumo ao interior.
quarta-feira
sábado
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